maio 04, 2010

Nota 10

Acontece que chegou aquela altura do trimestre em que é suposto eu avaliar e discutir os desempenhos das pessoas da minha equipa. Há um formato criado internamente para que todos possam ser avaliados segundo os mesmos critérios e para que assim seja mais fácil e mais justo pontuar aquilo que consideramos importante. Não vem ao caso o facto destas avaliações (descobri nos últimos tempos) não terem quase nenhuma repercussão em recrutamentos internos - alguém tem que as fazer e esse alguém sou eu.

Se antes, apesar de um pouco contrariada pelo número de colaboradores ou pelos prazos apertados, me dava algum gozo a pô-las de pé, neste momento elas assumem verdadeiramente o carácter de inutilidade sobre o qual já antes me tinham avisado. Não tenho nenhum caso especialmente grave a nível disciplinar e as avaliações são, no geral, até bastante boas. A única coisa que me está a custar é que não servem absolutamente para nada: não posso ajudar ninguém a progredir, a crescer dentro da empresa simplesmente porque esse futuro não nos está reservado. E então escrevo uma série de palavras ocas, ocasionalmente de louvor, noutras vezes sobre áreas a desenvolver, avalio o trimestre inteiro de pessoas que não sabem, na verdade, o que lhes vai acontecer. Que reacção espero eu delas? Pois que se estejam nas tintas para aquela hora de conversa e que queiram saber quando é que o fim é o fim.

Tenho muita, muita pena que o estado de graça da minha gravidez tenha que ser partilhado com o absoluto desastre da minha vida profissional do momento. Tenho medo que, quando um dia voltar a olhar para trás, as desilusões constantes desta recta final, o estado de apatia do qual não posso fugir possam manchar aquela que é muitas vezes descrita como a melhor altura da vida de uma mulher. Tenho medo de confundir as coisas e não recordar a felicidade extrema que sinto quando vejo a minha barriga a crescer, a ansiedade de ver esta pulguinha e ouvir o seu coração de cavalinho - tudo em troca de ter sido apanhada nesta trapalhada a que chamam mundos dos negócios. Eu sei que, quando se fecham portas, abrem-se janelas. Mas abrem-se exactamente para o quê?

3 comentários:

Augusta disse...

O que queremos é sempre diferente do que precisamos, quando as janelas se abrem, abrem para o que precisamos e nem sempre para o que queremos...sem soar conformista...ou pollyana, + o fato da barriguinha estar crescendo...ahhh as janelas já estão escancaradas...

curta!
bjus

Eurico Ricardo disse...

No caso em análise podes sempre optar por acreditar que os caminhos do Senhor são misteriosos e que o "timming" da tua gravidez colidiu com um contratempo na actividade laboral que desempenhavas previamente. Tudo isto para que possas conceber a gestação de um Ser no teu interior como um acto transcendente e que enche de alegria aquilo que, na existência de tão importante acontecimento, seriam momentos vazios ou sem sabor.

Atenção: não confundir o que escrevi com "prémio de consolação".
Nunca me passaria pela cabeça adjectivar uma gravidez dessa forma. Afinal de contas, eu sou bestial e não uma besta.

Eurico Ricardo disse...

(adenda: onde se lê "existência" deveria obviamente ler-se "ausência". :\