setembro 02, 2011

Where's M.?

Quase um ano depois de ter um filho, sinto-me mais perto de quem era antes. Aquela hora depois de acordar continua a ser um dos pontos altos do dia: o banho tomado em silêncio, o som dos aviões que sobrevoam a Estrela antes de aterrar, a ausência de sirenes e buzinas, os cinco km da A5 com o mar no horizonte enquanto me volto a comover com as músicas das manhãs da Radar, aquela sensação de satisfação de conduzir livre no sentido inverso às filas de trânsito. Continuo enfiada de cabeça naquilo que faço, dedicada a fazê-lo da melhor maneira que posso e sei, empenhada em ganhar a confiança e o respeito dos outros, aprendendo diariamente mais sobre as pessoas, sendo mais tolerante ao mesmo tempo que treino o meu cinismo. Quase um ano depois de ser mãe, olho-me no espelho e é como se já encaixasse melhor nesta pele, mesmo que ainda me surpreendam todas as vezes em que chamo o Vicente de filho, como se estivesse a viver um sonho e não pudesse acreditar que trouxe ao Mundo uma criatura tão bonita, macia, cheirosa, com uns olhos que iluminam qualquer sítio por onde passe. Olho-me no espelho e vejo alguém mais experiente mas muitas vezes não me sinto mãe e sinto-me só mais uma miúda de chinelos nos pés porque os saltos altos causam-me uma espécie de urticária. Continuo a gostar de cinema, de livros, de música, de séries, de viagens, de compras mas só que muitas vezes é difícil arranjar o tempo necessário para não deixar morrer cada um dos meus hobbies. E continuo a sonhar que sou freelancer e trabalho em casa e faço o meu horário, o que me dava imenso jeito para inspirar-me nas ruas de Campo de Ourique, descansar nos bancos do jardim da Estrela, ouvir as gargalhadas do meu filho na sala às onze da manhã, cozinhar almoço e jantar sem as pressas do costume, fazer planos e escrever bilhetes de amor. Só que claro, preciso trabalhar e não me deixar afogar na maré de más notícias e crises e despedimentos e creches a abarrotar e preços que sobem e violência banalizada e gratuita e ainda conseguir chegar ao fim do dia com um sorriso e uma mensagem positiva para o meu filho (caramba, tenho um filho!). 

E então tem sido difícil reencontrar-me. Toda a paixão anterior continua cá dentro e eu continuo a sonhar com o meu príncipe encantado - só que agora ele já dorme ao meu lado e eu simplesmente não preciso procurar mais. E isso claramente sossega-me o coração, que já não se aperta com os enganos gigantes, com os enormes falhanços onde acabava sempre por me meter e já não me dá insónias nem nós na garganta - antes, faz-me sentir (e já o disse tantas vezes) uma pessoa cheia de sorte.

Está a ser bom poder regressar. Está a ser bom ler os arquivos e saber que tudo aquilo que já vivi (e consequentemente escrevi) me fez chegar exactamente aqui, sem qualquer dor nem amargo de boca nem frustração. E como a minha capacidade de ser paciente tem vindo a ser constantemente a ser posta à prova, eu não me importo de esperar. E, sabendo que nunca mais serei a mesma, eu sei que estou quase quase a chegar.

3 comentários:

locusapien disse...

"'ADORO-TE LER!"'

Joana Real disse...

:D

Helena Barreta disse...

É-se certamente muito mais feliz quando temos alguém a chamar-nos de mãe e um amor a acompanhar-nos que é chamado de pai.

Felicidades e parabéns pela família que estão a construir.

Um beijo